Aprendizagem no Transtorno do Espectro Autista (TEA): o papel da família, da escola e das terapias

A aprendizagem é uma das grandes preocupações das famílias ao receber o diagnóstico de Transtorno do Espectro Autista (TEA). Afinal, como crianças com TEA aprendem? Quais estratégias são mais eficazes? E qual é o papel de pais, escola e terapeutas nesse processo?
Neste artigo, vamos refletir, com base científica e experiência clínica, sobre como apoiar a aprendizagem no Transtorno do Espectro Autista (TEA) de forma individualizada, respeitosa e eficaz.
O que é o Transtorno do Espectro Autista (TEA)
O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é um transtorno do neurodesenvolvimento que se manifesta na infância e acompanha o indivíduo ao longo da vida. Segundo o DSM-5 (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais), o TEA é caracterizado por dificuldades na comunicação social e pela presença de comportamentos repetitivos, interesses restritos e padrões sensoriais atípicos.
O Transtorno do Espectro Autista (TEA) se apresenta de forma diversa: há diferentes níveis de suporte (1, 2 e 3), diferentes perfis cognitivos e sensoriais, além de múltiplas combinações de habilidades e desafios. Por isso, o processo de aprendizagem precisa ser cuidadosamente adaptado às necessidades específicas de cada indivíduo.
Como aprendem as crianças com Transtorno do Espectro Autista (TEA)
Crianças com Transtorno do Espectro Autista (TEA) aprendem, sim. Mas aprendem de maneira diferente. A aprendizagem pode demandar repetições, adaptações visuais, uso de reforçadores e estratégias de ensino mais diretas. Com o suporte adequado, essas crianças são capazes de construir repertórios complexos e funcionais.
Veja algumas estratégias eficazes baseadas na ciência do comportamento:
1. Comandos claros e objetivos
A comunicação com crianças com Transtorno do Espectro Autista (TEA) deve ser direta. Frases curtas, tom de voz gentil e objetivos bem definidos favorecem a compreensão. Mesmo sem contato visual, muitas vezes a criança está ouvindo e compreendendo o que está sendo dito.
2. Uso de apoios visuais
A linguagem visual é uma aliada poderosa. Figuras, pictogramas, cronogramas ilustrados e até objetos concretos ajudam a tornar o aprendizado mais acessível. No Transtorno do Espectro Autista (TEA), o uso de apoio visual facilita a compreensão e reduz a ansiedade diante das demandas.
3. Modelação e imitação
Aprender observando o outro é uma via possível. Demonstrar como realizar uma atividade e, em seguida, convidar a criança a repetir, é uma prática comum na Análise do Comportamento Aplicada (ABA). Algumas crianças precisarão de apoio físico ou gestual no início, mas o objetivo é sempre a autonomia.
4. Reforço positivo
A motivação faz diferença. Ao identificar os interesses da criança, é possível usá-los como reforçadores após tarefas bem-sucedidas. Isso não significa “premiar o comportamento”, mas reconhecer conquistas e criar associações positivas com o aprendizado.
5. Ambiente estruturado
O Transtorno do Espectro Autista (TEA) demanda previsibilidade. Espaços organizados, rotinas claras e materiais bem selecionados promovem segurança e engajamento.
O papel da família na aprendizagem de crianças com Transtorno do Espectro Autista (TEA)
A família é o alicerce. Nenhuma intervenção será eficaz se não houver envolvimento familiar. Pais e cuidadores não precisam ser especialistas, mas precisam estar disponíveis, curiosos e abertos a aprender com a criança e com os profissionais.
Pais que participam das rotinas terapêuticas, praticam estratégias em casa e oferecem suporte emocional contribuem imensamente para a generalização de habilidades aprendidas. No Transtorno do Espectro Autista (TEA), o que se aprende em uma sala de atendimento precisa se aplicar na vida real. E é dentro de casa que muitas dessas conquistas ganham significado.
Além disso, os pais têm um papel insubstituível no incentivo, na autoestima e na autonomia da criança. O simples ato de confiar no potencial do filho é, por si só, uma ferramenta educativa poderosa.
O papel da escola na aprendizagem de alunos com Transtorno do Espectro Autista (TEA)
A escola é um espaço de socialização e de construção do conhecimento. No entanto, para que crianças com Transtorno do Espectro Autista (TEA) se beneficiem do ambiente escolar, é fundamental que exista adaptação curricular, formação de professores e um Plano Educacional Individualizado (PEI).
Esse plano deve considerar:
- O nível de suporte do aluno
- As habilidades que já possui
- Os objetivos educacionais possíveis e funcionais
- As estratégias que favorecem seu aprendizado
Em muitos casos, será necessário o apoio de um mediador escolar. De acordo com a Lei Brasileira de Inclusão (Lei n.º 13.146/2015), alunos com Transtorno do Espectro Autista (TEA) têm direito a acompanhante especializado em todos os níveis de ensino. Esse profissional não substitui o professor, mas atua como ponte entre o aluno e o conteúdo.
Quando escola e família caminham juntas, os avanços se multiplicam. A troca de informações, os registros sobre comportamentos e o alinhamento de expectativas constroem um caminho consistente.
O valor das terapias integradas no Transtorno do Espectro Autista (TEA)
O trabalho multidisciplinar é essencial. Cada profissional traz uma lente diferente e contribui para o desenvolvimento global da criança com Transtorno do Espectro Autista (TEA).
Entre as abordagens mais recomendadas estão:
- ABA (Análise do Comportamento Aplicada)
- Fonoaudiologia
- Terapia Ocupacional
- Psicopedagogia
- Psicomotricidade
- Musicoterapia
- Psicologia
O importante é que as terapias conversem entre si, mantenham objetivos alinhados e valorizem as individualidades. Quando as estratégias usadas na escola e na clínica se integram, a aprendizagem se fortalece.
As comorbidades e os desafios adicionais
Estima-se que 70% das pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) tenham comorbidades. As mais comuns incluem TDAH, transtornos de ansiedade e deficiência intelectual.
Essas condições podem impactar o processo de aprendizagem. Por exemplo, uma criança com TEA e TDAH pode ter mais dificuldade para manter a atenção, o que exige um planejamento didático mais dinâmico. Já dificuldades de leitura, interpretação de texto e abstração podem estar presentes mesmo em crianças com bom desempenho em matemática ou memória visual.
Cabe ao neuropediatra e à equipe terapêutica investigar e considerar esses fatores ao propor intervenções.
Cada criança aprende do seu jeito
No Transtorno do Espectro Autista (TEA), não existe um único jeito de aprender. Existe o jeito da criança.
Por isso, educar um aluno com TEA é, antes de tudo, um exercício de escuta e adaptação. É preciso observar, testar, errar e tentar de novo. As conquistas, ainda que pequenas aos olhos de muitos, são gigantes para quem acompanha o processo de perto.
História real: Miguel e as palavras escondidas
Miguel, de 6 anos, tem Transtorno do Espectro Autista (TEA) e dificuldade na fala. Mas adora letras. Sua terapeuta criou um jogo onde ele precisava encontrar letras escondidas em uma caixa de areia sensorial. A cada acerto, ganhava o direito de apertar o botão de uma música que ele amava.
Em pouco tempo, Miguel começou a formar palavras. O jogo virou um ritual. A alegria de brincar era a ponte para aprender. Esse é o poder da aprendizagem significativa no TEA: quando respeitamos a individualidade, o conhecimento floresce.
Conclusão
A aprendizagem no Transtorno do Espectro Autista (TEA) é possível, potente e cheia de nuances. Exige tempo, escuta, criatividade e, acima de tudo, respeito à singularidade de cada criança.
Família, escola e terapias não atuam isoladamente. Quando caminham juntas, formam a rede de segurança que toda criança precisa para crescer, aprender e se sentir pertencente.
É nessa rede que o autismo encontra espaço para se expressar, se desenvolver e conquistar seus próprios caminhos.
Assinatura da autora
Artigo escrito pela Dra. Letícia Bringel, psicóloga especialista em Autismo (CRP 23/504), Mestra em ABA pela PUC/GO, Supervisora CABA BR 2024/005 e CEO do Grupo Estímulos e da Comunidade Estímulos Brasil.
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