Férias com uma criança autista: como criar uma rotina leve, previsível e divertida dentro de casa

Organizar as férias com uma criança autista pode parecer desafiador para muitas famílias. A quebra na rotina escolar, a interrupção temporária das terapias e a ausência de atividades previamente estruturadas costumam trazer mudanças importantes no cotidiano da criança. Para muitas delas, essa perda de previsibilidade pode gerar ansiedade, desorganização emocional e alterações no comportamento.
No entanto, com o suporte adequado, planejamento cuidadoso e uma abordagem respeitosa às necessidades sensoriais e cognitivas, é possível transformar as férias com uma criança autista em uma oportunidade rica de conexão familiar, desenvolvimento funcional e bem-estar emocional. Este artigo reúne orientações práticas, baseadas em evidências, que podem auxiliar cuidadores e profissionais a aproveitarem esse período de forma mais tranquila e significativa.
Por que as férias com uma criança autista exigem mais organização?
Crianças com Transtorno do Espectro Autista tendem a se beneficiar de rotinas estruturadas, previsíveis e repetitivas. A constância no ambiente e nas atividades diárias contribui para reduzir o esforço cognitivo necessário para lidar com mudanças e incertezas. Nas férias, a ausência dessa estrutura pode gerar insegurança e desregulação.
Durante as férias com uma criança autista, é comum surgirem dificuldades relacionadas ao sono, à alimentação, ao comportamento e à interação social. O tempo livre excessivo e a falta de referências claras sobre o que vai acontecer podem ser gatilhos para crises ou comportamentos desafiadores. Por isso, mesmo em períodos de descanso, é importante manter uma organização funcional da rotina, sem rigidez, mas com previsibilidade e acolhimento.
Como planejar uma rotina adaptada durante as férias com uma criança autista
Para aproveitar as férias com uma criança autista de forma tranquila, é essencial organizar a rotina de maneira flexível, respeitando o tempo da criança e oferecendo atividades que combinem estímulo e descanso. Um recurso valioso é o uso de calendários visuais, nos quais as atividades do dia são representadas por imagens, símbolos ou fotografias reais. Esse tipo de suporte aumenta a compreensão e reduz a ansiedade.
Durante as férias com uma criança autista, algumas estratégias podem ser adotadas para manter uma rotina equilibrada:
- Estabelecer horários fixos para alimentação, sono, higiene e tempo livre.
- Alternar entre atividades mais estruturadas e momentos de brincadeira livre.
- Incluir tempo de tela de forma programada, com uso de cronômetro visual, se necessário.
- Incorporar pequenas tarefas domésticas adaptadas à faixa etária como forma de desenvolver autonomia.
Manter uma estrutura básica ao longo do dia ajuda a criança a antecipar o que virá, o que contribui para maior participação nas atividades e menor resistência às mudanças.
Atividades sensoriais são aliadas nas férias com uma criança autista
Crianças autistas geralmente apresentam perfis sensoriais muito específicos. Algumas são hipersensíveis ao toque, som ou luz, enquanto outras buscam intensamente estímulos proprioceptivos ou táteis. Durante as férias com uma criança autista, é possível utilizar atividades sensoriais como forma de promover bem-estar, regulação emocional e engajamento.
Massinhas, pintura com os dedos, brincadeiras com espuma, água ou arroz colorido são ótimas opções para estimular o sistema sensorial de forma lúdica e segura. O ideal é observar quais tipos de estímulos a criança busca naturalmente e incorporar essas experiências ao longo da rotina.
As atividades sensoriais não precisam ser complexas ou caras. Um pequeno balde com água morna e brinquedos submersos pode se transformar em um momento terapêutico e relaxante. Brincadeiras assim ajudam a criança a se reorganizar emocionalmente e favorecem a atenção compartilhada.
As férias com uma criança autista também são momento de reforço positivo
Durante as férias com uma criança autista, as oportunidades para ensinar novas habilidades e reforçar comportamentos adequados continuam presentes. O reforço positivo é uma ferramenta importante nesse processo. Trata-se de reconhecer e valorizar os comportamentos desejados, com elogios, gestos, palavras ou recompensas previamente combinadas.
Quando a criança participa de uma atividade proposta, colabora em uma tarefa ou respeita um limite estabelecido, o reforço deve ser imediato e específico. Isso aumenta as chances de que o comportamento se repita. Nas férias com uma criança autista, é possível usar o reforço positivo para estimular autonomia, organização e convivência em família.
Pode-se utilizar cartelas de adesivos, potes da gratidão ou combinações simples como “após organizar os brinquedos, vamos brincar juntos com o quebra-cabeça favorito”. O reforço não precisa ser material. Muitas vezes, a atenção do adulto, um abraço ou o direito de escolher a próxima brincadeira são mais eficazes do que prêmios físicos.
Equilibrar novidades e familiaridade é essencial nas férias com uma criança autista
As férias com uma criança autista oferecem uma boa oportunidade para apresentar novas experiências, mas é importante que isso seja feito com cuidado. Crianças neurodivergentes tendem a se sentir mais confortáveis com aquilo que já conhecem, por isso o ideal é intercalar atividades inéditas com brincadeiras ou objetos familiares.
Se for apresentar um jogo novo, por exemplo, faça isso em um momento calmo, quando a criança estiver bem regulada. Explique as regras com clareza, mostre imagens e pratique junto. Em seguida, convide a criança a escolher uma atividade já conhecida, como ouvir a música preferida ou brincar com blocos.
Essa alternância entre desafio e conforto ajuda a criança a ampliar seu repertório sem se sentir pressionada ou sobrecarregada. Durante as férias com uma criança autista, respeitar esse equilíbrio contribui para uma convivência mais leve e satisfatória.
As pausas são tão importantes quanto as atividades nas férias com uma criança autista
Durante as férias com uma criança autista, é fundamental lembrar que o tempo de pausa é parte da rotina. Crianças autistas costumam se sobrecarregar mais facilmente diante de estímulos prolongados ou mudanças constantes. Reservar momentos de descanso, silêncio e autorregulação ao longo do dia é essencial.
Criar um espaço tranquilo em casa, com objetos que proporcionem segurança emocional, é uma excelente forma de favorecer esses momentos. Pode ser um canto com almofadas, fones de ouvido com músicas suaves, brinquedos sensoriais ou simplesmente a companhia silenciosa de um adulto que entende seus sinais.
As pausas devem ser oferecidas de forma previsível, mas também podem ser solicitadas pela própria criança. Ensinar formas de expressar essa necessidade, por meio de gestos, palavras ou cartões visuais, é uma estratégia importante para promover autorregulação e comunicação funcional.
Como lidar com a ausência das terapias durante as férias com uma criança autista
Durante as férias com uma criança autista, é comum que as sessões terapêuticas sejam temporariamente suspensas. Isso pode gerar dúvidas nos cuidadores sobre como manter os estímulos sem sobrecarregar a rotina familiar. A boa notícia é que é possível continuar promovendo desenvolvimento mesmo fora do ambiente clínico.
Solicitar orientações simples aos terapeutas sobre como adaptar as atividades em casa é uma forma eficaz de manter a continuidade. Muitas vezes, pequenos ajustes em brincadeiras já realizadas pela criança podem ter grande valor terapêutico. Utilizar histórias sociais, jogos estruturados, treinos de habilidades adaptativas e conversas guiadas são caminhos viáveis para manter o aprendizado em andamento.
Vale lembrar que o brincar com presença, intenção e afeto é, por si só, uma forma poderosa de intervenção. Durante as férias com uma criança autista, estar disponível emocionalmente e observar atentamente suas interações pode ser tão significativo quanto uma sessão formal.
Considerações finais
As férias com uma criança autista podem sim ser um momento de alegria, descoberta e fortalecimento de vínculos familiares. Para isso, é importante que os adultos envolvidos estejam dispostos a adaptar expectativas, reorganizar rotinas e valorizar cada conquista, por menor que ela pareça.
Manter uma estrutura previsível, oferecer atividades sensoriais e lúdicas, reforçar comportamentos positivos, respeitar os limites e incluir pausas regulares são estratégias que ajudam a construir uma experiência mais acolhedora para todos. Com empatia, conhecimento e presença, as férias com uma criança autista deixam de ser um desafio e se tornam uma oportunidade de convivência autêntica e respeitosa.
Assinatura oficial da autora:
Artigo escrito pela Dra. Letícia Bringel, psicóloga especialista em Autismo (CRP 23/504), Mestra em ABA pela PUC/GO, Supervisora CABA BR 2024/005 e CEO do Grupo Estímulos e da Comunidade Estímulos Brasil.
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